Noturno I
Por entre agulhas de sono,
caminhei meu caminhar.
Não tinha casa nem dono
e não sabia cantar.
Por entre agulhas de sono,
alonguei o meu olhar.
Ai, paisagem de abandono!
Sequer sabia chorar.
Por entre agulhas de sono,
flores brancas de luar.
E no chão, lanças de sombra
longas como o meu olhar.
Resvalavam entre os dedos
invisíveis coisas mortas
– ocasos na madrugada –
quando as agulhas se abriram
em mil rosas encarnadas.
Calada brecha no tempo,
ofereceram-se abertas,
mas o vento do meu sono
tocou as flores do instante
e recompôs o deserto.
Agora respiro o sonho
daquela noite apagada.
Por entre agulhas de sono
transito hoje (acordada?).
E vou perguntando a espectros,
por órbitas descabidas,
se das agulhas de pedra
brotam as rosas da vida.