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A menina que me visita: a sala de espera do meu médico

A sala de espera do meu médico é bem arrumadinha. Lá tem um móvel de bambu, assim amarrado com palha, igual às cadeiras que a gente senta esperando, e um tapete do mesmo tamanho e também um quadro na parede do mesmo tamanho, tudo tão igual que parece que foi de propósito.

Em cima do móvel tem vários objetos e os que eu gosto mais são os três vasos vermelhos porque o outro vaso parece que é uma coisa de metal sem ser de metal, só pintado de tinta de metal, e minha mãe nunca acha bonitas as coisas que imitam outras, como ouro de mentira ou plástico fingindo cristal, porque primeiro a gente pensa que é, mas quando pega, vê que é leve, e depois fica assim todo arranhadinho. E esse vaso, se for de metal mesmo, então eu acho que é de alumínio, que também é leve e também arranha.

O quadro na parede tem uma figura que parece de um bebê esquisito com a boca zangada, ou de um sapo, ou de um ser extraterrestre cheio de mãozinhas. Pode ser que seja um bebê antes de nascer, muito esquisito mesmo, mas mesmo assim eu gosto, principalmente porque depois eu venho embora e não preciso ficar olhando todo o tempo para ele.

A sala de espera do meu médico é bonita e boa e também limpinha, com um cheiro especial de armário de roupa de mãe por dentro e banheiro limpo. Eu já vivi muitas horas lá, se juntar todos os minutos que eu chego antes.

Só não gosto tanto do outro armário, acho ele um pouco feio e um pouco bonito, não sei explicar se é por causa da pintura, ou se porque chegou depois e me deu susto de não conhecer antes, junto com o resto. A pintura, eu falo, porque nunca vi armário com essas manchas verdes assim escuras, meio misturadas de marrom com um pouco de cinzento, de um verde mais claro é que eu já vi, e essas escuras parecem um pouco com roupa de soldado camuflado. Acho que é normal a gente levar susto com um soldado camuflado aparecendo assim de repente. Dentro desse armário, tem uns bonecos que eu também não gosto muito, mas tem uma lhama azul de flores e uma tartaruga que eu gosto mais de tudo que fica lá. Agora, acho que eu só vou gostar mesmo desse armário, daqui a muito tempo, quando estiver bem acostumada e não vier mais aqui, e aí eu vou descobrir que gostava dele, sim, gostava um pouco torto, mas gostava.

E assim termina a sala de espera do meu médico.

POSTADO EM 19 DE JULHO
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